SONHO COM JEITO DE PRECE


Ubiratan Lustosa

 

Sempre sobra, dentro de nós, um pouco da criança que fomos um dia.

Talvez aí se explique o remanescer de um pouco de pureza em pessoas que, machucadas pela vida, continuam acreditando nas coisas boas, não perdem a esperança em dias melhores, e, mesmo a caminho da velhice ainda conseguem sonhar.

Ao chegar a festa do nascimento de Jesus revigora-se em nós a criança que restou e que vive escondida no fundo do nosso peito.
Pois essa criança que ainda existe em mim tem um pedido para fazer a Papai Noel. Eu gostaria que o bom velhinho nos desse de presente a paz que nos falta. Paz total, individual e coletiva, nacional e internacional.
Paz que é quietude, doçura, bem-estar.
Paz que é união, fraternidade, amor.
Paz abrangente, envolvente, que existe por si e não se faz com armas.
Paz que não precisa de canhões para ser obtida, que não exige mortes para sobreviver.
Paz que não se embasa na miséria de uns e na opulência de outros, que é efetiva e não apenas mera figura de retórica.

Se Papai Noel nos desse esse presente, nós o repartiríamos felizes e entraríamos no ano novo sentindo-nos mais dignos daquele menino que nasceu sobre as palhas de uma manjedoura e cujo aniversário estamos festejando.

É um devaneio infantil, eu sei, mesmo porque a paz não vem de fora, mas deve ser encontrada dentro de nós mesmos.
De qualquer forma, é um pedido ao bom Noel.
Quem sabe na sua sacola cheia de mistérios ele tem alguma fórmula mágica capaz de modificar os homens e transformar o mundo.
Não custa sonhar, pedir e esperar.

Como seria bom o mundo sem guerras, sem opressão, sem violações dos direitos de cada um e de todos, sem ódios e sem perseguições.
Como seria bom se a inteligência humana ao invés de se consumir na criação de letais artefatos bélicos fosse aplicada, apenas, na busca da cura para os males que nos afligem.
Como seria bom se as verbas imensas utilizadas na manutenção das guerras fossem usadas para eliminar do mundo a tragédia da fome, para edificar escolas e hospitais.

É um sonho vão, dirá você com os pés no chão, pisando o solo dessa dura realidade dos nossos dias.

É um sonho, sim, um sonho com jeito de prece.

E para uma prece dessas, que os anjos digam amem.

 

Do livro NOSSO ENCONTRO COM UBIRATAN LUSTOSA.
Instituto Memória Editora.

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