O RAPAZ DE TERNO BRANCO
Autor: Ubiratan Lustosa
Fazia um frio danado em Curitiba no dia em que me anunciaram o cantor e
compositor que estava na sala de espera. Ele queria falar com o diretor
da Rádio Marumby. Na época era eu. Corriam os anos 50.
Cognominada "a Emissora das iniciativas", a Marumby transmitia
futebol, tinha auditório, elenco de artistas e se orgulhava de estar
presente nos grandes eventos.
Para fazer frente às poderosas Rádio Clube Paranaense e Rádio
Guairacá, a Marumby tinha que se mexer. E conseguia o seu lugar ao
sol graças ao dinamismo da sua programação. Ocupava
todo o segundo andar do Edifício "Dante Luiz", na Rua XV.
- Mande entrar o rapaz, disse eu.
E vi surgir diante de mim o jovem vestido
de branco, violão embaixo do braço, simples e até meio
tímido. Tiritando de frio, contou que era do norte do Paraná,
região quente, mal chegara a Curitiba e não tinha roupas adequadas
ao nosso clima.
Era bom de papo. Falou-me sobre suas composições, seu desejo
de trabalhar em centros maiores e mostrar o seu talento.
Expliquei que também em Curitiba os artistas encontravam muitas dificuldades.
Havia três Rádios com programas de auditório, mas não
tínhamos gravadoras de discos em nossa cidade.
Depois de ouvir algumas de suas composições, impressionado
com o talento do rapaz, aconselhei que tentasse São Paulo, onde certamente
conseguiria êxito. Na sua humildade ele disse que ainda não
se sentia preparado para um centro assim tão grande, por isso viera
a Curitiba, numa espécie de estágio, preparando um salto maior.
A Rádio Marumby já dera guarida a tanta gente, tantos principiantes
que depois se tornaram famosos... por que não apoiar esse rapaz do
norte do Estado? E ele fez uma série de apresentações
nos programas de auditório, mostrando as suas composições
belíssimas com melodias encantadoras e letras de poesia comovente.
Após algum tempo foi embora.
Anos depois, encontrei o rapaz em São Paulo. Era dono de um simpático bar noturno e já era respeitadíssimo no meio artístico local. Compositores e cantores freqüentavam a sua casa dando "canja" às pessoas presentes com músicas muitas vezes recém-criadas. Suas composições corriam de boca em boca e algumas tinham sido gravadas. Entre elas, "QUERIA", que depois foi regravada por Hebe Camargo, e "MARIA, CARNAVAL E CINZAS" que Roberto Carlos defendeu num dos famosos festivais de música.
"Nasceu Maria, quando a folia
perdia a noite, ganhava o dia,
foi fantasia seu enxoval;
nasceu Maria no carnaval".
O rapaz atingira o seu objetivo, mostrara o seu talento. Seu nome: LUIZ CARLOS PARANÁ. Um poeta verdadeiro, um compositor excepcional.
Um dia eu soube da sua morte, prematura,
cedo demais. Quantas composições ficaram sem que a gente as
conhecesse? Quantas demonstrações de talento ficaram ocultas?
Carlos Paraná deixou saudade e quem o conheceu sempre lembra dele,
daquele jeito tranqüilo de falar, daquela genialidade ao compor.
Numa de suas músicas ele disse: "Queria que nunca fosse preciso
esquecer". Meu caro Carlos Paraná, nós não o esquecemos.
Deus o tenha.
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